ESPECIAL STAR TREK 50 ANOS DE UMA LONGA JORNADA

Star Trek – Jornada nas Estrelas, uma das séries televisivas mais importantes, conhecidas e influentes da cultura pop-nerd está completando 50 anos de existência. Seu impacto e originalidade reverberam suas influências e conceitos até hoje em diversos segmentos, seus personagens, mais que emblemáticos, ganharam vida própria no imaginário cultural do século XX e atravessaram gerações com extrema facilidade. E, para comemorar esse meio século de sucesso de Jornada nas Estrelas, vamos realizar uma série de matérias sobre a série, desenhos, filmes e sobre a sua dublagem.

star trek 50 anos

Star Trek 50 anos – Meio Século além da última fronteira

[dropcap size=small]A[/dropcap] série foi criada por Eugene Wesley Roddenberry que escrevia discursos para chefes de Policia e vendia seus roteiros para várias séries policiais e de faroestes. Roddenberry criou a série The Lieutenant (O Tenente), estrelada por Gary Lockwood e contou com vários atores de Star Trek como Nichelle Nichols e o renomado Leonard Nimoy.

Para vender a serie ele criou conceitos de mundos paralelos com humanoides, usando poucos efeitos especiais que barateavam os custos da série. A série era formada por um trio central (Cap. April, Numero 01 [Mulher fria e inteligente] e Spock [alienígena], então Roddenberry apresentou à MGM, Fox (Perdidos) e Desilu que aceitou o programa (pertencente a Desi Arnaz e Lucille Ball – Além da Imaginação, Os Intocáveis e I Love Lucy).

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The Cage foi considerado pelos executivos cerebral e “bom demais”. A série narrava as aventuras de uma tripulação multirracial numa nave estelar de pesquisa da Federação Unida de Planetas. A Federação é uma ONU espacial e possui um braço militar que é a Frota Estelar. Os tripulantes da nave são oficias e membros da Frota.

Produziram outro piloto chamado de Onde Nenhum Homem Jamais Esteve, com mais ação e elenco diferente, o único mantido foi Spock (Leonard Nimoy) por insistência de Roddenberry, com novo elenco estrelado por William Shatner (Cap. Kirk), com Paul Carr Gary Lockwwod, sendo que neste episódios vemos Scotty e Sulu entre os tripulantes. O primeiro episódio filmado com os personagens Uhura (Nichelle Nichols), Scotty (James Doohan) e Sulu (George Takei) foi Ardil Carbomite.

Os vilões romulanos e os klingons foram criados pela necessidade de opositores à Federação. Roddenberry acreditava no modo de vida americano e nos vilões fazia alegoria aos soviéticos/comunistas. A fórmula do sucesso da série? Roteiros bem escritos, elenco entrosado (trio Spock-Kirk-McCoy) e clima da trama (ser humano evoluído/vivendo em harmonia contrapondo Guerra do Vietnam).

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Dois nomes foram importantes no inicio da série: Gene L. Coon e D. C. (Dorothy) Fontana. Coon criou os Klingons, a Primeira Diretriz, o Tratado de Orgânia (celebrando a paz entre os Klingons e a Federação) e o vilão Khan (Semente do Espaço); Coon morreu em 1973, não testemunhando sucesso da série. Fontana que começou como secretaria de Roddenberry, depois foi promovida a roteirista e assumindo algum tempo depois a função de produtora associada e responsável pelos roteiros.

Star Trek – A segunda temporada

[dropcap size=small]A[/dropcap] segunda temporada de Star Trek sofre uma redução no orçamento, o que acarreta uma preocupação nos produtores. Gene L. Coon deixa a serie e decide cuidar de outros projetos. Roddenberry se fasta mais da produção. Nesta temporada temos a chegada de um personagem que permaneceria até o final da serie e apareceria nos filmes: o Alferes Chekov (Walter Koenig).

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Apesar do corte de orçamento, esta foi a melhor das três temporadas. Houve um aprofundamento nas bases da 1ª. temporada (roteiros bem escritos, centrados no trio: Kirk-Spock-McCoy e uma clima de família e companheirismo na tripulação). Tivemos episódios memoráveis e alguns entraram para a história da televisão norte-americana, mas, também, tivemos episódios muito fracos e que glorificavam a politica norte-americana, a qual, certamente, Roddenberry acreditava e apoiava.

O sensacional O Espelho inova por combinar conceitos de ficção-científica pura de universos paralelos, com ação e personagens bem construídos. Muito tempo depois outras series e series da própria franquia abordariam este tema. Alguns melhores que outros.

Outro momento de ficção-cientifica de ótima qualidade foi Lamento por Adonis, onde abordou-se a questão: Eram os deuses astronautas? A tripulação encontra um alienígena com poderes, levando-os a crer que ele foi considerado um deus na Terra. Maquinas gigantes de destruição vagando pelo universo, como em Maquina de Destruição, com um capitão da federação ensandecido e obcecado em destruí-la. Interpretações inspiradas e, novamente, bons roteiros.

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No maravilhoso episodio Torre de Babel, somos apresentados aos pais de Spock, introduzindo um personagem que apareceria nos filmes, desenhos e series da franquia: Sarek (interpretado por Mark Lenard). Na trama temos ação, aventura, drama e ficção-científica, como nunca visto na TV. A serie atinge o seu ápice. Tempo de Loucura foi outro episódio marcante por abordar uma temática sexual de forma direta e pessoal, sem parecer vulgar ou apelativo. É um episódio marcante pela relação do trio central.

A série ousou em mostrar episódio com humor: Um Pedaço de Ação, onde a tripulação explora um planeta no qual os habitantes imitam os humanos da época do gangster Al Capone, ver William Shatner imitando o ator especialista em interpretar gangsters James Cagney. É memorável. Outro episódio de humor foi o divertido O Problema aos Pingos, onde somos apresentados as criaturas conhecidas como Pingos que encantam os tripulantes e atrapalham os planos da Federação.

Roddenbery tencionava criar uma nova serie e apresentou as ideias na forma de um episódio chamado Missão: Terra, onde a tripulação volta no tempo e acidentalmente intercepta a chegada de um humano criado por uma raça alienígena avançada chamado Gary Seven (Robert Lansing).

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Gary chega com a missão de proteger a Terra, sendo ajudado por sua secretaria Roberta (Terry Garr). Infelizmente, nenhum estúdio se interessou pelo projeto e ele não passou deste piloto. Infelizmente, Roddenbery exaltou a política americana da época, onde acreditava que os ideias e a política norte-americana estavam corretas, como vimos em Uma guerra particular e Gloria de Omega, com americanos versus soviéticos/comunistas. Novamente a NBC anuncia cancelamento da série, resultando num aumento do movimento de fãs, com um cerco aos escritórios da Rede da NBC com passeatas e panfletagem nos carros dos executivos da rede e um recorde de cartas enviadas.

A NBC decide renovar a serie, mas com mudanças.

Star Trek – A terceira temporada

[dropcap size=small]A[/dropcap]terceira temporada é a mais fraca de todas, havendo um corte no orçamento maior do que o corte que a serie já havia sofrido na temporada anterior. Houve, também, uma mudança na data e horário de exibição, nesta temporada a serie deixou a terça-feira para sexta-feira as 22:00 horas.

Este horário é considerado a morte de qualquer serie. Diante desta situação Roddenbery se afasta da produção da serie, que passa a ser produzida por Fred Freiberger. Freiberger é culpado pelos péssimos roteiros e pelo clima tenso, decorrente do medo de cancelamento que assombra o estúdio.

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Lamentavelmente, esta é a pior das três temporadas, servindo de exemplo, no que uma serie não deve fazer com seus personagens e roteiros. A temporada começa já dizendo a que veio com o horrível Cérebro de Spock, onde temos o seqüestro do cérebro do personagem por alieniginas. É um roteiro fraco e infeliz, onde tudo de bom que a serie construiu ao longo das temporadas anteriores foi destruído.

Os Filhos de Platão é um episodio famoso, não pela qualidade do roteiro, mas por apresentar o primeiro beijo inter-racial da historia da TV. O que falar de um episódio onde seres super-poderosos seqüestram Kirk, Spock, Uhura e Chapel para serem ridicularizados? O Intruso é outro exemplo de fraco episodio que descaracteriza os personagens, pois um antigo amor do Capitão Kirk troca de corpo com ele, o qual passa a agir de forma estranha, inclusive, decretando a morte de uma pessoa e Spock e McCoy nada fazem.

Somente ao final do episódio que Spock e McCoy percebem o comportamento estranho do amigo? Roddenbery voltou a escrever o roteiro de um episódio Há beleza na verdade?, mas foi acusado de criar esta historia com o intuito de vender um colar chamado de IDIC (Infinita Diversidade em Infinitas Combinações).

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O maior exemplo desta mudança, inexplicável, na personalidade dos personagens foi o fraquíssimo Todos os Nossos Ontens, no qual Spock, vegetariano, apenas por viajar no tempo, consome carne e aprecia o sabor. Outro lamentável exemplo do que foi esta temporada é o horrível Joia Rara, onde alieniginas capturam Kirk, Spock e McCoy para descobrir se devem ou não ajudar o mundo da empata chamada Joia. O detalhe do episódio é que não existem cenários na maioria das cenas.

O que existe é um eterno e desconfortável fundo preto em todas as cenas mostradas. Um episódio que escapa destas características que dominaram a temporada (que no caso são: fraco e horrível) foi o regular A Teia Toliana, onde Kirk desaparece, cabendo a Spock e McCoy unirem forças para libertarem a Enterprise de uma teia criada pelos Tolianos e encontrarem a cura para a tripulação infectada por uma doença. Outro que escapa desta situação foi A Ultima Batalha, onde dois seres de uma mesma raça iniciam uma batalha movidos por racismo.

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O episódio discute esta questão de forma aberta, sendo memorável quando Bele (o sensacional Frank Gorshin, o Charada da serie Batman) explica o motivo do racismo e da luta. Observamos um roteiro bom, mas com uma produção fraca. Diante deste quadro, é lógico que a audiência despencou e a série foi cancelada em 1969.

Com isso, ela foi vendida para Sindication (pequenas redes locais), onde passa a ser exibida mais cedo (pela manhã e a tarde), inclusive, diariamente. Torna-se um sucesso com convenções de fãs e se transformando em fenômeno cultural nos EUA.

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A dublagem de Star Trek: Versão AIC

[dropcap size=small]A[/dropcap] dublagem é um elemento essencial para o sucesso ou fracasso de uma série no Brasil, sendo objeto ao mesmo tempo de amor e ódio pelos telespectadores. Mas algo é indubitável: o fascínio que exerce sobre todos. Quem de nós nunca ficou curioso em saber quem está por trás da voz do personagem que tanto gostamos de assistir? Jornadas nas Estrelas (Star Trek) chegou ao Brasil em 1967 para ser exibida na programação noturna da extinta TV Excelsior, sendo distribuída pela empresa Brascontinental. Foi dublada pelo estúdio A.I.C. (Arte Industrial Cinematográfica), atual B.K.S., em São Paulo, responsável pela dublagem de grandes seriados dos anos 60 como: Viagem ao Fundo do Mar, Perdidos no Espaço entre outros.

A A.I.C. marcou a “era de ouro” da dublagem nacional, período assim conhecido em virtude da alta qualidade dos profissionais envolvidos, tamanha era a qualidade das vozes e da interpretação, onde vários personagens tinham mais de uma voz. Alguns até três, o que nunca foi motivo de descontentamento entre os fãs. Assim aconteceu, também com Jornada nas Estrelas.

O Capitão Kirk teve três vozes: Emerson Camargo, Dênis Carvalho e Astrogildo Filho. Camargo, filho do saudoso ator e pioneiro da dublagem Volney Camargo, deu ao personagem uma voz suave e tranquila. O ator/diretor (da Rede Globo) Dênis Carvalho, que não dubla mais, foi quem mais se aproximou do tom seco e autoritário original que Shatner possuía quando jovem (foi a primeira voz brasileira de Roger “Race” Bannon de Jonny Quest). Astrogildo Filho (dublou a primeira voz do prof. John Robinson de Perdidos no Espaço), já falecido, possuía uma voz mais empostada, ficando famoso por não conseguir pronunciar corretamente a palavra klingon (saia klincon, klincun, tudo menos o correto), foi quem mais dublou o personagem. Astrogildo dublou o Capitão Kirk nas segunda e terceira temporadas.

O Sr. Spock teve duas vozes: a primeira foi a do falecido Rebello Neto (a segunda voz do Prof. Robinson de Perdidos no Espaço) que dotou o personagem de um a frieza e interpretação excepcional, ficando duas temporadas. Na terceira temporada foi substituído por Turíbio Ruiz, que aliás está bem vivo e pôde ser visto trabalhando em novelas da Rede Globo como em Araguaia. Turíbio ficou muito conhecido, por interpretar “Seu Alfredo”, nos antigos comerciais do papel higiênico Neve.

O Dr. McCoy, chamado carinhosamente pelo Capitão Kirk de “Magro” (Bones no original), foi dublado inicialmente por Neville George que com seu tom suave, conseguiu reproduzir no médico da nave um forte sotaque de interior (no original o sotaque era da Georgia). Destaca-se que o dublador era representante comercial, sendo descoberto nos estúdios de dublagem e passando a falar por vários personagens famosos (como Doug Phillips de O Túnel do Tempo). Faleceu em 2003, sendo que atuava como locutor oficial da Rede TV!.

Na segunda temporada o Doutor passou a ser dublado por João Angelo (a voz dos Dominantes em Spectreman) que manteve o ar implicante do personagem, com um toque mais emotivo.

A voz da Tenente Uhura pertencia à Helena Samara (a voz da inesquecível atriz Agnes Moorehead, a Endora de “A Feiticeira”). Esta veterana dubladora acentuou ainda mais a interpretação original da atriz ao “emprestar” sua bela voz para “abrir e fechar freqüências”.

Carlos Campanelli (a voz de Tony Newman de O Túnel do Tempo) foi a voz do Sr. Scotty, o qual em início de carreira, procurou ressaltar o humor e a eficiência do personagem, pecando, infelizmente, em não conseguir reproduzir o seu característico sotaque escocês. Curiosamente, o ator era bancário antes de tornar-se dublador, sendo bastante conhecido por ser a voz do Super-Homem (desenho exibido pelo Canal da Warner) e o vilão Freeza em Dragon Ball Z.

Eleu Salvador dublou o Sr. Sulu (a voz do Dr. Brown de “De Volta para o Futuro” nos filmes e no desenho), conseguindo reproduzir o tom grave original do ator e aumentando seu humor em certas situações. Infelizmente já é falecido, sendo considerado uma dos melhores e mais versáteis atores da dublagem.

O Alferes Checov foi dublado por Olney Cazarré (foi a voz de James Stephens/Dick York de A Feiticeira). O falecido ator pôde ser lembrado pelo grande público, como o aluno Paulistão (e torcedor do Corinthians) da Escolinha do Prof. Raimundo. Sua bela voz realçou a juventude e vitalidade do personagem, não conseguindo reproduzir o marcante sotaque russo que possuía no original o personagem.

Curiosamente, O Alferes havia feito pontas na primeira temporada, onde foi dublado por Marcelo Gastaldi (a primeira voz do Chaves e Chapolin). O texto de abertura era lido pelo locutor Antônio Celso, uma voz neutra, diferente do original que era lido pelo ator William Shatner. Celso pode ser lembrado como o apresentador do desenho Space Ghost e da serie Durango Kid. A direção da serie ficou a Cargo de Emerson Camargo na primeira temporada e a partir da segunda temporada foi dirigida por Ary de Toledo até seu final.

A dublagem da AIC foi marcante e repleta de vozes inesquecíveis, fazendo ajustes de tradução ao longo da série como fator de torção substituído para fator de dobra, “defasadores” para “feisers”, “triregistro” para “tricorder” e abrilhantou a série com grandes vozes que até hoje permanecem na memória auditiva dos fãs.

Ocorre que em 1982, por ocasião da exibição do segundo filme para o cinema no Brasil, misteriosamente, esta cópia foi recolhida e devolvida a matriz nos EUA, o que sepultou as vozes, somente tendo acesso a este trabalho os fãs que gravaram os episódios em vídeo quando foi exibida pela ultima vez na Rede Bandeirantes.

A Dublagem de Star Trek: A Serie Animada

[dropcap size=small]C[/dropcap]om o estrondoso sucesso das reprises da serie, o estúdio Paramount decide trazer a serie de volta com a produção de novos episódios, mas em razão dos custos de produção, foi feita a opção em produzir uma serie animada.

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O único que concretiza isto é o estúdio de animação Filmation (He-Man, She-Ra), que decide produzir uma série de desenhos com duas temporadas (1973 e 1974) e 22 episodios, tendo por base a estrutura apresentada com atores reais. Ela resgatou e ampliou vários conceitos da serie original.

star-trek-the-animated-series-coverO desenho da Filmation foi dublado pela Alamo em São Paulo, sendo um dos primeiros trabalhos do estúdio e contou com a maioria das vozes da dublagem da serie com atores:

  • Kirk – Astrogildo Filho;
  • McCoy – João Angelo;
  • Uhura – Helena Samara;
  • Sulu – Eleu Salvador;
  • Scotty – Carlos Campanille.
  • Spock passou a ser dublado pelo ótimo Garcia Netto (Charles Bronson nos filmes Desejo de Matar III a V) que manteve o ar compenetrado e pensativo.

Felizmente, como a serie com a dublagem original estava sendo exibida, a tradução manteve muitas expressões utilizadas.

Lamentavelmente, esta dublagem esta perdida e quando a serie foi lançada em DVD, a distribuidora optou, de forma equivocada, em não oferecer nem a dublagem original e tão pouco uma redublagem. É uma pena.

Atualmente, tem-se a notícia que a Netflix exibirá toda a produção de Star Trek, dentre eles a serie animada, a qual certamente contará com uma redublagem.

 

Sobre o Autor

Carlos Amorim é trekker, fã de séries de TV, cinema, pesquisador de dublagem, com mais de trinta anos de experiência em cultura pop. Além disso tudo ele ainda gosta de seriados cinematográficos e filmes antigos.

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