Filme | Logan

Logan (2017. Direção: James Mangold. Roteiro: Michael Green, Scott Frank e James Mangold. Elenco: Hugh Jackman, Patrick Stewart, Richard E. Grant, Boyd Holbrook, Stephen Merchant, Dafne Keen.)

LoganEm outubro de 1999, durante as filmagens de X-Men, o primeiro filme da franquia dos mutantes, o ator Dougray Scott, escalado no elenco, decidiu abandonar a produção, três semanas após o começo das filmagens. O seu papel ficou vago. Bryan Singer, o diretor, decidiu escutar o ator Russell Crowe, e fez um teste com a indicação dele, um australiano de 31 anos, que ninguém conhecia.

Singer achou bom, achou que iria funcionar, e de última hora, com as filmagens já iniciadas, o escalou para a produção. O seu papel seria o de Wolverine. Seu nome era Hugh Jackman.

Pouco mais de 17 anos depois, sentei-me na cadeira de uma sala de cinema para assistir o final dessa trajetória, que começou de uma forma nada convencional, mas que se mostrou a mais grandiosa, entre todos os filmes de super-heróis.

Um ator marcante, que esteve em todos os filmes da franquia dos mutantes, e que ganhou uma série solo dentro da franquia, faz a sua despedida em Logan.

Toda a propaganda do filme já foi emocionante. Do anúncio do último filme, das sagas que iria adaptar, dos trailers carregados de músicas fortes e cenas emocionantes, até o último momento que antecedeu a estreia da produção.

Quando estava entrando na sala de cinema, consegui perceber que, apesar do tempo, apesar de todos os trailers, e de toda a empolgação, ninguém parecia estar preparado para dar adeus ao Wolverine que conhecemos, e que remodelou o herói para sempre.

O filme começa, e em pouco tempo, já sentimos a carga emocional que ele traz consigo. Logan está debilitado. Já em 2029, o metal adamantium em seu corpo, que o tornava mais resistente, agora o envenena, impedindo o pleno funcionamento de seu fator de cura. Para tentar evitar a dor, ele se tornou um alcóolatra depressivo, que trabalha como chofer para ganhar a vida, em um mundo onde não nascem novos mutantes há mais de 10 anos.

A única coisa que o mantém vivo é Charles Xavier (interpretado majestosamente, mais uma vez, por Patrick Stewart), que sempre teve uma relação de mentor e protetor de Logan. Aqui, os papéis se invertem, e é o Carcaju quem cuida do Professor X, que, atacado pelo Mal de Alzheimer, mudou a característica de sua mente, de “mais poderosa do mundo” para “mais perigosa do mundo”.

Desmotivado, Logan segue sua vida, evitando os problemas, ganhando dinheiro para consumir suas bebidas alcóolicas e comprar os remédios do Professor X, contando com a ajuda de Caliban (na versão de Stephen Merchant) para cuidar do ex-líder dos X-Men, os quais já estão extintos e mortos.

Logan

Mas, para a surpresa do mutante, o problema vai até sua porta, e se chama Laura. Uma garota calada, introvertida, e que não aparenta ter nada de especial que chame a atenção de Logan. Mas, graças ao talento escondido (e agora revelado) da atriz Dafne Keen, nos surpreendemos com o quanto Laura é especial: ela se revela como a primeira versão cinematográfica da X-23, a mutante que tem os mesmos poderes e habilidades de Wolverine. Ela é “bem parecida” com ele, como diz Xavier.

E a partir daí, já temos motor suficiente para prosseguir com a história.

James Mangold, o diretor do filme (e que também dirigiu o antecessor, Wolverine: Imortal), envolve o ambiente em todo o clima de despedida. El Paso, Texas, parece o cenário perfeito para todo o triste desenvolvimento dos personagens da produção. Mangold se entregou a um projeto difícil, do jeito que era necessário, e podemos ver isso em todas as belas tomadas do filme, correndo pelas estradas estadunidenses, com cenários fantásticos demais pra pertencerem ao Universo X-Men.

O filme, no entanto, se desenvolve diferente do que estamos habituados a ver, quando compramos ingressos para um filme de super-herói. Todas as promessas que a Fox fez ao divulgar o filme, embalado por uma trilha sonora lenta e sentimental, foram cumpridas em cena.

Quem entra na sala de cinema para assistir Logan, e espera um filme dinâmico e cheio de ação, como Capitão América: Guerra Civil, está bem enganado: Logan é um drama sobre super-heróis. E não pensem que isso é algo ruim, só porque é inédito: é incrível.

Não é que não tenham cenas de ação: tem sim, e como tem. Não só tem, como são brutais. Brutais MESMO. De terem membros decepados (e isso não é spoiler). Só um filme de super-heróis foi tão cruel assim: Deadpool (coincidentemente, da Fox), e nenhum dos dois é leve (não levem seus filhos para assistir).

Mas o forte da produção está em outro foco: o desenvolvimento dos personagens é a coisa mais bela de Logan.

Hugh Jackman se dedicou como nunca para ser o Wolverine pela última vez, e entrega aqui, uma versão do mutante jamais vista nos outros oito filmes que fez como o Carcaju. Em Logan, nós temos um Wolverine humano. Nem é mais Wolverine, é só Logan mesmo. Abatido, depressivo, com a consciência de que as coisas não são (e nem serão) mais as mesmas. Cuidando do Xavier decadente, e agora, com uma menina que lembra a ele mesmo. Se já achávamos Logan grosseiro, rude e animal, nesse filme, ele está mais ainda. E, contraditoriamente, está mais cheio de sentimentos, se rendendo à sua condição, que o torna cada vez menos mutante, e cada vez mais um ser humano.

Em Patrick Stewart e Dafne Keen, Hugh Jackman sustenta o seu Logan, desenvolvendo o afeto pelos personagens, da forma que jamais vimos nos cinemas. Seja com a sensação de perda de seu mentor, ou com a aparição de alguém que o veja como herói, Logan cria sentimentos que são bonitos de ver. Sem dúvida, é a melhor performance de Hugh Jackman nos cinemas, e é a melhor versão de Logan dos cinemas.

Os antagonistas não levam o desenvolvimento a sério. Apesar da bela, divertida e até curiosa atuação de Boyd Holbrook como Donald Pierce, o líder dos Carniceiros, ele não trouxe muita ameaça para Logan e seus protegidos, servindo apenas para dizer os protagonistas têm de quem correr.

O mesmo se aplica ao Dr. Zander Rice, interpretado por Richard E. Grant, que deveria servir como um William Stryker do futuro (até por estarem “ligados”), mas é ainda menos ameaçador que Pierce.

Todavia, nenhum desses fatores abala a grandeza dos protagonistas em cena, que impacta até os mais céticos quanto aos filmes de super-heróis, Marvel, Fox, X-Men ou qualquer coisa.

Ao longo do filme, são incontáveis as vezes nas quais as pessoas choraram com Logan. Seja nas cenas com o Professor X, seja nas cenas entre o Carcaju e Laura, ou toda vez que o próprio Logan em decomposição aparece nas telas, é emocionante até o fundo.

Para Hugh Jackman, que acaba aqui a sua saga, iniciada sem querer, como segunda opção de Bryan Singer em 2000, apenas posso dizer, em nome de todos os fãs: muito obrigado. Toda a sua dedicação e o seu empenho em dar vida a um dos maiores personagens já criados, foram recompensados a cada filme, com todo o clamor. E esse empenho ao seu alter ego, já está eternizado. Seremos eternamente gratos, por nunca teres sido o que tentaram te fazer ser.

Faltam as palavras para as emoções que o filme nos causa, e para expressarmos as nossas gratidões aos 17 anos que Hugh Jackman dedicou a nós. Mas os aplausos ao final de Logan falam tudo por nós.

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Um ajudante de super-herói perdido em Tatooine, com várias pedras de metanfetamina.

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